domingo, 20 de março de 2011

Trifolium subterraneum (Fabaceae) I

O trevo-subterrâneo é a minha planta preferida.
O que tem de especial uma pequena planta anual, prostrada e de flores inconspícuas?
Vou demorar três, ou mais posts para explicar o porquê.
Começarei pela forma e por alguns aspectos da biologia do trevo-subterrâneo. No próximo post falarei dos mecanismos de dispersão. E no seguinte explicarei porque esta planta é tão importante. Feita a soma obtemos a mais notável espécie da nossa flora.
O T. subterraneum é uma herbácea pratense indígena de Portugal. É uma indiferente edáfica, com uma clara preferência por solos derivados de substratos duros (não vai lá muito bem areias) de territórios de clima mediterrânico. Sendo uma planta anual de óptimo mediterrânico germina com as primeiras chuvas outonais. Como tem um sistema radicular relativamente superficial, conclui o ciclo de vida na Primavera quando não haja mais água no solo para consumir.
Cresce e floresce rente ao solo. A folhas apresentam três folíolos (folhas compostas trifolioladas), obcordados (com a forma de coração estilizado) e peludos, impossíveis de confundir com os de qualquer outro trevo da flora de Portugal. As flores organizam-se em pequenos capítulos axilares que facilmente passam desapercebidos.
O trevo-subterrâneo suporta bem o pisoteio e a herbivoria por animais domésticos, quer de ovelhas, quer de vacas ou burros. Os herbívoros domésticos não só deprimem potenciais competidores - a sombra de outras plantas é uma forte ameaça à sua persistência - como facilitam a sua dispersão.
A morfologia dos trevos-subterrâneos é extraordinariamente variável. Experimentem no campo, com a ajuda de uma lupa, identificar linhas de trevo-subterrâneo. Há-as com caules glabros e com caules hirsutos (e todo o tipo de estádios intermédios); ...

 ... com estípulas glabras ou peludas; com pedicelos e pecíolos glabros ou peludos; com marcas-de-água nas folhas e sem elas; com manchas vermelhas nas folhas ou não; com cálices verdes ou vermelhos ...

... e por aí a diante.
Algumas linhas começam a florir em Fevereiro, outras ainda têm flores no final de Abril. Alguns trevos-subterrâneos vivem em solos pobres e secos, e outros em solos ricos nas vizinhança de cursos de água.
A variabilidade desta planta em Portugal é vastamente grande (uma combinação feliz de palavras que não foi inventada por mim). Um património genético que nos poderá vir a ser muito útil!

[o tema fertilidade da terra ficou a meio; um dia desta voltarei ao assunto]

8 comentários:

  1. Então mas... e a Euphorbia pedroi? ;-) Estou a brincar!
    Não vejo muito este trevo por estes lados, não deve frequentar os mesmos sítios habituais que eu.
    Claro que estou bastante curioso para saber todas as tuas razões para afirmares isso!

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  2. Os gostos mudam com a idade ;)
    Há uns 10 anos atrás admirava plantas exuberantes tipo Muschia, Tolpis azorica, eufórbias grandes, Quercus seculares ou orquídeas. E claro, plantas raras; um comportamento não muito diferente do coleccionador de caricas (cabazinhos) de marcas locais de refrigerantes ou cromos de Vickie que fui quando era garoto. Agora gosto de leguminosas e gramíneas, porque são a base do funcionamento dos ecossistemas e dos agroecossistemas. O trevo-subterrâneo será, estou disso convencido, uma peça essencial dos sistemas de agricultura do futuro. A combinação de uma biologia da dispersão notável, com adaptações fantásticas à herbivoria e a capacidade de fixar azoto e fornecer alimentos aos animais, fazem do trevo-subterrâneo a rainha das plantas pratenses mediterrânicas. Se tivesse que escolher outra planta para colocar no altar além do trevo-subterrâneo, escolheria o trigo. E a maioria dos sistemas tradicionais de agricultura não são baseados na combinação de uma leguminosa com uma gramínea? Estou-me a antecipar, não faz mal ;)

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  3. cabazinhos = caricas? e quem é a Vickie (ou o Vickie) dos cromos?
    (eu por acaso sempre gostei de leguminosas e gramíneas... Trifolium, Medicago, Lotus, Trigonella, Ornithopus, Coronilla, etc. sempre me pareceram géneros simpáticos e fascinantes... assim como Lathyrus, Vicia, Anthyllis, Hymenocarpos, etc.!)

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  4. E é verdade que os gostos mudam com a idade ;)
    Também passei a dar muito valor às lentilhas, tremoços, ervilhas, etc.!...

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  5. É tudo uma questão de ponto de vista!
    Eu deliro com plantas que contam histórias de vida (evolutivas) bizarras, cujo passado foi atribulado e que sofreram muito para cá chegar; muitas vezes pondo desafios à nossa compreensão do que se terá passado. Claro que em última análise todas as espécies têm episódios notáveis e tempos difíceis; mas o caso da E.pedroi toca-me particularmente forte, não pela sua raridade ou endemismo, mas sim porque estamos a ver ali à nossa frente, e sem qualquer dúvida, as marcas deixadas por essa história antiga, de uma forma tão exagerada que até nos sufoca!
    Mas ainda espero por outro post no qual expliques porquê a tua preferência pelo trevo-subterrâneo e não um dos outros!

    (também já passei pela fase das orquídeas! ;-) acho que todos nós já devemos ter passado por essa fase em concreto..!)

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