domingo, 27 de fevereiro de 2011
Uma orquídea não identificada (Orchidaceae)
É tempo de narcisos e de orquídeas e aqui fica uma delas, exótica, de belas folhas alternas, cuja identificação não conhecemos. Pode ser que algum dos ilustres naturalistas que frequentam este blog possa identificar a dita orquídea ornamental!
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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Fertilidade da terra, Eça de Queirós e von Liebig (I)
"...
O tio Jacinto contemplava, triste, o pé de roseira quebrado, rosnando:
— Corja! Quem!? Vão lá saber quem! Há-de ser a mesma cambada que me vinha roubar as batatas! Se eu pilho um!
— Então você plantava batatas no cemitério, homem?
— Então, porque não, Sr. Arturzinho? Mas lá o Sr. Alves, o da Câmara, começou a implicar. Disse que até era pecado. Pecado é tirar a um pobre o bocadinho do seu negócio. Ricas batatas; também lhe digo, não há terra de semeadura como isto. — E com um gesto largo indicava o cemitério: — É tudo o que V. Sª lhe plante. Está abarrotadinho de estrume!
..."
[A Capital, Eça de Queirós, 1925]
O Tio Jacinto sem perceber chavelho de química ou de pedologia sabia o que era preciso para repor a fertilidade da terra. Como todos os agricultores orgânicos seus contemporâneos tinha consciência que a fertilidade da terra dependia, em exclusivo, da incorporação no solo de matéria orgânica, viesse ela de cadáveres em decomposição, do enterramento de infestantes, dos resíduos das culturas, da nitreira ou da loja das vacas. O Tio Jacinto punha prática um dos princípios fundamentais de gestão da fertilidade da terra, formulado nos meados do séc. XIX, mais precisamente em 1848, o ano da comuna de Paris e do manifesto comunista, por Justus von Liebig: "[para manter a fertilidade da terra] tudo o que é extraído do solo tem que ser devolvido na sua totalidade».
Na agricultura pré-industrial a disponibilidade de nutrientes, sobretudo de azoto, era a maior limitação da produtividade agrícola. O herói do A Capital, o Arturzinho, e o coveiro Tio Jacinto vivem em Ovar. Para repor as perdas de azoto os ovarenses da altura dispunham de um extraordinário adubo: os moliços extraídos da ria de Aveiro. Como nos demais sistemas de agricultura orgânica, a gestão da fertilidade da terra do solo passava inevitavelmente pela reciclagem dos nutrientes, por exemplo pela compra de estrumes vendidos de porta em porta, por gente cuja profissão era recolher as bostas de vacas pelos caminhos rurais.
Passaram mais de cem anos desde que Eça de pena na mão desenhou personagens tão notáveis como Arturzinho, Gonçalinho ou Jacintinho, e discorreu como mais ninguém sobre a sociedade orgânica do Portugal do Séc. XIX.
Desconfio, porém, que sabia mais Eça de fertilidade da terra do que a larga maioria das gentes que hoje habita o país.
Não me surpreende.
Os nossos estudantes saem dos liceus a saber tudo sobre o ciclo de Krebs e demais parafernálias bioquímicas da modernidade, mas não fazem a menor ideia de que o solo e as plantas são reactores que obedecem às leias da química e da física que controlam uma reacção química simples num tubo de ensaio.
Se às plantas lhes faltam a comida e a luz param de crescer e senescem. E o seu destino, tal como o nosso, é mineralizarem-se no solo, num processo que os cientistas eufemisticamente apelidam de amonificação, e fecharem os ciclos de nutrientes. Foi neste novelo de ciclos de matéria e energia que se acomodou a agricultura, uns milhares de anos antes do Tio Jacinto.
O tio Jacinto contemplava, triste, o pé de roseira quebrado, rosnando:
— Corja! Quem!? Vão lá saber quem! Há-de ser a mesma cambada que me vinha roubar as batatas! Se eu pilho um!
— Então você plantava batatas no cemitério, homem?
— Então, porque não, Sr. Arturzinho? Mas lá o Sr. Alves, o da Câmara, começou a implicar. Disse que até era pecado. Pecado é tirar a um pobre o bocadinho do seu negócio. Ricas batatas; também lhe digo, não há terra de semeadura como isto. — E com um gesto largo indicava o cemitério: — É tudo o que V. Sª lhe plante. Está abarrotadinho de estrume!
..."
[A Capital, Eça de Queirós, 1925]
O Tio Jacinto sem perceber chavelho de química ou de pedologia sabia o que era preciso para repor a fertilidade da terra. Como todos os agricultores orgânicos seus contemporâneos tinha consciência que a fertilidade da terra dependia, em exclusivo, da incorporação no solo de matéria orgânica, viesse ela de cadáveres em decomposição, do enterramento de infestantes, dos resíduos das culturas, da nitreira ou da loja das vacas. O Tio Jacinto punha prática um dos princípios fundamentais de gestão da fertilidade da terra, formulado nos meados do séc. XIX, mais precisamente em 1848, o ano da comuna de Paris e do manifesto comunista, por Justus von Liebig: "[para manter a fertilidade da terra] tudo o que é extraído do solo tem que ser devolvido na sua totalidade».
Na agricultura pré-industrial a disponibilidade de nutrientes, sobretudo de azoto, era a maior limitação da produtividade agrícola. O herói do A Capital, o Arturzinho, e o coveiro Tio Jacinto vivem em Ovar. Para repor as perdas de azoto os ovarenses da altura dispunham de um extraordinário adubo: os moliços extraídos da ria de Aveiro. Como nos demais sistemas de agricultura orgânica, a gestão da fertilidade da terra do solo passava inevitavelmente pela reciclagem dos nutrientes, por exemplo pela compra de estrumes vendidos de porta em porta, por gente cuja profissão era recolher as bostas de vacas pelos caminhos rurais.
Passaram mais de cem anos desde que Eça de pena na mão desenhou personagens tão notáveis como Arturzinho, Gonçalinho ou Jacintinho, e discorreu como mais ninguém sobre a sociedade orgânica do Portugal do Séc. XIX.
Desconfio, porém, que sabia mais Eça de fertilidade da terra do que a larga maioria das gentes que hoje habita o país.
Não me surpreende.
Os nossos estudantes saem dos liceus a saber tudo sobre o ciclo de Krebs e demais parafernálias bioquímicas da modernidade, mas não fazem a menor ideia de que o solo e as plantas são reactores que obedecem às leias da química e da física que controlam uma reacção química simples num tubo de ensaio.
Se às plantas lhes faltam a comida e a luz param de crescer e senescem. E o seu destino, tal como o nosso, é mineralizarem-se no solo, num processo que os cientistas eufemisticamente apelidam de amonificação, e fecharem os ciclos de nutrientes. Foi neste novelo de ciclos de matéria e energia que se acomodou a agricultura, uns milhares de anos antes do Tio Jacinto.
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Tropaeolum majus (Tropaeolaceae)
Esta extraordinária beldade sul-americana -que também se encontra naturalizada entre nós, como planta ruderal- já havia sido referida nos comentários do post anterior e então aqui fica:
Tropaeolum majus Linnaeus, Sp. Pl. 1: 345. 1753. (as minus, corr. in errata).
Tropaeolum majus in Flora of North America @ efloras.org
IPNI Plant Name Query Results
Tropaeolum majus - Wikipedia, the free encyclopedia
Como acompanhamento musical, vamos sugerir excelente música sul-americana - do notável grupo brasileiro Kid Abelha:
YouTube - Pintura Intima
YouTube - Kid Abelha - Pintura íntima (Rock in Rio - 2001)
YouTube - Kid Abelha Pintura Intima
sábado, 19 de fevereiro de 2011
Eschscholzia californica (Papaveraceae)
Esta verdadeira princesa da Califórnia, um endemismo norte-americano, felizmente subespontânea em Portugal, é, actualmente, uma das mais belas plantas da nossa flora!
Eschscholzia californica Cham., Horae Physicae Berolinensis 1820
Type Information: "Habitat in arenis sterilibus siccis ad portum Sancti Francisci Californiae. Nunc, semine adlato, in hortis nostris, favente coelo, hospitabitur."
IPNI Plant Name Details
Eschscholzia californica in Flora of North America @ efloras.org
California poppy - Wikipedia, the free encyclopedia
Muito ornamental, a Papoila da Califórnia embeleza frequentemente as margens dos nossos caminhos e estradas.
Para acompanhamento musical, nada mais apropriado do que ouvir o grande Brian Wilson, o mais famoso compositor californiano:
YouTube - The Wondermits (Brian Wilson)-Mexican Girl
YouTube - Brian Wilson - Good Kind Of Love
YouTube - BRIAN WILSON - JUST LIKE ME AND YOU [HQ]
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Papaveraceae,
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vegetação ruderal
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
Narcisus scaberulus (Amaryllidaceae)
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Narciso-do-Mondego
O Narciso-do-Mondego foi descrito pela primeira vez para a ciência pelo Professor Júlio Henriques. É um endemismo lusitano (BA e BL), que ocorre apenas ao longo do curso médio da bacia hidrográfica do rio Mondego (encostas dos vales dos rios Mondego, Seia e Cobral). Estima-se que a sua área de ocorrência seja um pouco superior a 50 km², repartida por vários núcleos populacionais com relativa continuidade pelos concelhos de Carregal do Sal, Gouveia, Mangualde, Nelas, Oliveira do Hospital, Seia e Tábua.
Ocorre preferencialmente sobre plataformas e afloramentos rochosos graníticos, em pinhais e clareiras de matagais. As inflorescências suportam de uma a cinco flores pequenas, de um amarelo vivo, e as tépalas são ovadas maiores ou do mesmo tamanho que a coroa. O período de floração é muito curto e decorre entre os meses de Fevereiro e Março.
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O Sítio de Interesse Comunitário Carregal do Sal, incluído na Rede Natura 2000, foi criado e delimitado fundamentalmente devido à presença desta espécie. Encontra-se incluída no Plano Nacional de Conservação da Flora em Perigo e listada nos Anexos II e IV da Directiva habitats. Possui também vários núcleos fora da área geográfica do Sítio.
Os fogos que passado Verão consumiram uma área significativa ao longo do vale do Mondego, vieram de alguma forma beneficiar esta espécie, ou pelo menos torná-la mais visível e competitiva, em alguns locais, onde o estrato arbustivo formado por giestas e estevas era já demasiado extenso e denso. Este geófito encontra-se neste período em plena floração.
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Vegetação rupícola
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
Que árvore é esta? (III)
Genista florida (Fabaceae)
Como se constrói um montado de giestas?
Quatro etapas:
1) Suspensão da agricultura - a mobilização do solo elimina irremediavelmente as plantas herbáceas pratenses e os arbustos;
2) Reconstrução por sementeira ou por abandono do estrado arbustivo - a sementeira, por exemplo do Cytisus striatus, era uma prática comum no norte e centro de Portugal sendo a sementeira das giestas, muitas vezes, realizada em simultâneo com o cereal no último ano antes do pousio; as giestas instalavam-se então sob a protecção do cereal; durante a ceifa (à mão) havia o cuidado de não as danificar;
3) Desadensamento e condução dos arbustos;
4) Estabilização do coberto herbáceo pelo pastoreio.
Um dos últimos grandes agrónomo portugueses - o Engº Fernando Gusmão - contou-me há uns meses atrás, que no Barroso, antes da chegada dos adubos de síntese, se praticava uma rotação de 14 anos com giestas (C. striatus) nas terras mais pobres: 13 anos de giesta e 1 de cereal. Uma rotação semelhante de 7 anos foi-me explicada para a Terra-Quente transmontana.
Quem quiser aprofundar o papel das giestas nos sistemas de tradicionais de agricultura da montanha portuguesa tem que ler os artigos do Prof. George Estabrook (ver aqui).
Remato o post com uma ideia de investigação que pelos vistos nada tem de novo: o montado de giestas. A recuperação deste modelo não é despiciente se tomarmos em consideração as ameaças à segurança alimentar que pairam sobre globo, e que a síntese da amónia depende, em exclusivo, de energias fósseis. Depois até pode ser uma forma de ajudar a desenvolver no mediterrânico o conceito de "forest garden" proposto pelos permacultores.
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domingo, 13 de fevereiro de 2011
Checklist da flora vascular de Portugal
Foi finalmente disponibilizada uma Checklist da Flora Vascular de Portugal Continental e Insular (ver aqui).
Um pdf da checklist completa pode ser solicitado aqui.
A dado passo referem os seus autores que "a colaboração de profissionais e amadores da botânica é ... uma componente essencial no futuro e na utilidade social e científica da Checklist da Flora de Portugal (Continente, Açores e Madeira)". Para tal, propõem o seguinte mecanismo de colaboração:
a) "A ALFA disponibiliza a todos os interessados em colaborar nos trabalhos de actualização um endereço de e-mail dedicado (alfachecklist@gmail.com);
...
c) Informa a direcção da ALFA que existe um acordo com a revista científica Silva Lusitana, editada pelo INRB, IP, de publicação bianual, para a publicação, em tempo útil, de alterações nomenclaturais e taxonómicas inéditas e das adições corológicas à escala dos três grandes territórios abrangidos pela Checklist – Lu, Az e Ma
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Um pdf da checklist completa pode ser solicitado aqui.
A dado passo referem os seus autores que "a colaboração de profissionais e amadores da botânica é ... uma componente essencial no futuro e na utilidade social e científica da Checklist da Flora de Portugal (Continente, Açores e Madeira)". Para tal, propõem o seguinte mecanismo de colaboração:
a) "A ALFA disponibiliza a todos os interessados em colaborar nos trabalhos de actualização um endereço de e-mail dedicado (alfachecklist@gmail.com);
...
c) Informa a direcção da ALFA que existe um acordo com a revista científica Silva Lusitana, editada pelo INRB, IP, de publicação bianual, para a publicação, em tempo útil, de alterações nomenclaturais e taxonómicas inéditas e das adições corológicas à escala dos três grandes territórios abrangidos pela Checklist – Lu, Az e Ma
...
e) As propostas de alteração aceites, e os respectivos autores, serão devidamente divulgados no site da ALFA.
f) Todos os anos, em Janeiro, será publicada e difundida uma nova versão, actualizada, da “ALFA-Checklist da flora vascular de Portugal”.
Aqui fica o anúncio de uma etapa importante da história recente da botânica portuguesa e um pedido de colaboração que os botânicos, amadores ou profissionais, não devem (não podem) recusar.
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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
Drosophyllum lusitanicum (Drosophyllaceae)
Esta maravilha ainda aqui não tinha aparecido:
Drosophyllum lusitanicum (L.) Link, Neues J. Bot. 1(2): 53. 1805 [Nov 1805]
= Drosera lusitanica L. Sp. Pl. 1: 282. 1753 [1 May 1753]
IPNI Plant Name Details
Esta rara espécie insectívora é nativa e endémica da Região Mediterrânica Ocidental: Portugal, Espanha e Marrocos. A família Drosophyllaceae é monogenérica e monoespecífica, como se pode confirmar na seguinte enciclopédia:
Drosophyllum - Wikipedia, the free encyclopedia
Como acompanhamento musical, vamos sugerir a excelente composição de George Harrison Within You Without You:
YouTube - Within You Without You - The Beatles
YouTube - Within You Without You The Beatles
sábado, 5 de fevereiro de 2011
Soleirolia soleirolii (Urticaceae) e mais um insecto
Trazemos hoje aqui uma bela Urticácea decorativa: Soleirolia soleirolii (Req.) Dandy,
Feddes Repertorium 70: 4. 1965 = Helxine soleirolii Req., Annales des Sciences Naturelles (Paris) ser. 1 5: 384. 1825
IPNI Plant Name Query Results
Soleirolia soleirolii in Flora of North America @ efloras.org
Esta espécie é a única de um género monoespecífico e foi assim denominada em homenagem a Joseph-François Soleirol por Esprit Requien. Soleirol era um botânico amador que herborizou originalmente esta bela planta na Córsega, de acordo com a excelente enciclopédia a seguir citada:
Soleirolia soleirolii - Wikipedia, the free encyclopedia
...E ainda um interessante insecto que nos parece ser um Himenóptero, talvez uma espécie de abelhão negro, na esperança de que algum dos ilustres naturalistas que frequentam habitualmente este blog o possa identificar.
Trata-se de um insecto zumbidor bastante irrequieto que parece gostar bastante de flores, podendo mesmo talvez polinizá-las.
Antecipadamente, os nossos agradecimentos pela eventual identificação deste insecto, que não deve ser raro em Portugal e se torna activo ainda durante o Inverno.
Sugestão musical para este post: a excelente Private Revolution dos World Party:
YouTube - World Party "Private Revolution"
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