quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Aster aragonensis (Asteraceae)

Nos meados de Setembro, depois de três meses, ou mais, sem chuva, a terra ressequida que intervala as estevas do vale profundo da Terra Quente, ou os arbustos da montanha nordestina, brilha sob o sol ainda vibrante do final do Verão. As plantas perenes cerram os estomas até ao ponto em que a temperatura das folhas periga todo o sistema fotossintético. As plantas anuais há muito concluíram o seu ciclo biológico, e permanecem escondidas no solo, expectantes, reduzidas a semente. Os regatos secaram, e com eles as Mentha, os Epilobium, Scrophularia, e demais plantas higrófilas. Aqui e ali desponta uma folha de gramínea perene beneficiada por um veio capilar de água subterrânea. Os animais domésticos comem, ou comiam, quando os havia, melhor dizendo, a folha ripada do Fraxinus angustifolia «freixo-de-folhas-estreitas» e do Ulmus minor «ulmeiro», um raminho novo de Ulex «tojo» ou Pterospartum «carqueja», uma ponta de restolho calcinado pelo sol, o caule agostado de um Agrostis ou de um Arrhenatherum, ou, ainda, uma rara ervita fresca de sítio sombrio e húmido. Complementavam a alimentação do animal, alguma Cucurbita maxima «abóbora-porqueira» ou erva da cortinha, segada com foice ou gadanha, palha e pouco feno (há que guardá-lo para o Inverno), o mesocarpo (polpa) da drupa da Prunus dulcis «amendoeira» (a amêndoa fica para trás, protegida pelo caroço, i.e. pelo endocarpo) ou, mesmo, a folha libertada pela Olea europaea «oliveira», também ela sedenta, e precisada de reduzir a copa transpirante. Os rebanhos mais afortunados de gado miúdo (ovelhas e cabras) desciam ao vale do grande rio permanente, ao Sabor ou ao Côa, por exemplo, e pastavam a estreita margem verde de Festuca ampla, Agrostis e Paspalum, que serpenteia na imediata vizinhança dos poços lênticos ou de um teimoso fiozinho de água.

Terra-Quente transmontana (NE de Portugal). Em primeiro plano oliveiras, em segundo amendoeiras, e lá de trás bosque misto de Quercus rotundifolia (Fagaceae) «azinheira» e Juniperus oxycedrus (Cupressaceae) «zimbro», com algum Quercus suber (Fagaceae) «sobreiro» emergente. N.b. o J. oxycedrus distingue-se pelas copas semelhantes à chama de uma vela [Concelho de Alfândega da Fé]]

Sente-se um compasso espera. A vida está em suspenso até à chegada das primeiras chuvas outonais. Até o agricultor, se não tiver uvas para vindimar, goza dias de calmaria, enquanto aguarda pela época das sementeiras.
Acabaram as flores. O botânico pode regressar ao herbário, ou partir de férias, até Outubro, altura ideal para colher as bulbosas de Outono.
Será?

Aqui, no Nordeste, numa unidade geológica a que os geólogos chamam, se não estou enganado, "Unidade Autóctone Superior", temos uns xistos ditos verdes, duros e de lenta meteorização ("formam" solo muito lentamente), ricos em bases (e.g. cálcio e magnésio), que albergam uma flora bem curiosa. Uma das plantas que aqui se encontram é esta:


Aster aragonensis (Asteraceae), um endemismo ibérico, pontual no NE de Portugal. N.b. na 2ª foto as folhas glaucas (=azuladas) de outro endemismo ibérico, a Festuca summilusitana (Poaceae), descrita por J. do Amaral Franco e Mª da Luz Rocha Afonso em 1980. A esta gramínea nem as cabras lhe pegam! [Bragança, Serra de Nogueira]

Pois bem. Tudo seco? Dizia eu? Nem tudo, acreditem. Não sei como é, mas este Aster transpira, literalmente, vida, quando tudo o mais morre pela chegada da água e das noites frescas de Outono.
[fotos C. Aguiar]

3 comentários:

  1. Uma verdadeira maravilha - TM, os seus bosques, as suas rochas verdes e o belo Aster!!

    Apenas ma pequena nota: O género Aster tem sido recentemente (e não só) dividido em vários géneros:

    Name: Galatella aragonensis (Asso) Nees
    Nomencl. ref.: Gen. Sp. Aster.: 167. 1832

    Greuter, W. (2006-2009): Compositae (pro parte majore). – In: Greuter, W. & Raab-Straube, E. von (ed.): Compositae. Euro+Med Plantbase - the information resource for Euro-Mediterranean plant diversity.

    zg

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  2. É uma planta não só belíssima como também extraordinariamente resistente à falta de água!!

    zg

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