quarta-feira, 28 de julho de 2010

Smilax azorica (Smilacaceae)
















Seguindo o exemplo do ilustre botânico JCapelo, aqui fica uma outra Smilax endémica, esta do Arquipélago dos Açores. Pensamos que se trata da Smilax azorica H.Schaef. & P.Schönfelder, Homenaje al Prof. Dr. Wolfredo Wildpret de la Torre 304. 2009. Este nome substitui o anterior Smilax divaricata Sol. ex H.C.Watson London J. Bot. iii. (1844) 608, por razões nomenclaturais, conforme aqui se pode consultar:
IPNI Plant Name Query Results
Supomos que esta bela espécie é um endemismo raro das Ilhas dos Açores, onde se pode encontrar na laurissilva, a exemplo da sua congénere madeirense que ontem foi publicada neste blog.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Smilax pendulina Lowe

Smilax pendulina Lowe (Madeira, 2004; foto: Sandra Mesquita)


Em recente viagem á Madeira vi levadas, que por terem rebentado, arrastaram partes significativas de encostas com laurissilva de til (Clethro arboreae-Ocoteetum foetentis) e lembrei-me entretanto desta planta. Tem sido referida em floras e outras publicações, como 'Smilax aspera', esta salsaparrilha da Madeira. É uma planta da laurissilva madeirense. São plantas geralmente inermes (sem espinhos), as folhas verde-claras, são baças ou com um brilho mate e ceroso e têm consistência sub-rígida, por vezes quase herbácea. Os frutos são avermelhado-claros quando completamente maduros, com ca. de 1,2 - 1,5 cm de diâmetro, de secção triangular-arredondada. Solicito agora o pequeno incómodo de confrontar os citados caracteres com uma descrição de S. aspera. Pode ser aqui na Flora iberica. Os deslizamentos na laurissilva resultam do encontro da perturbação gravitacional espontânea, das chuvadas catastróficas e de alguma irreflectida engenharia. Com muitas outras plantas, entre elas tis centenários, as derrocadas deste ano - algumas com largas dezenas de metros de extensão, arrastaram banais Smilax aspera ou endémicos S. pendulina? Julguem os leitores por si próprios , se nos serve uma taxonomia assim?

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Vicia articulata (Fabaceae)

Aqui há tempos referi, neste blogue, que a Vicia articulata estaria extinta em Trás-os-Montes (vd. aqui).
Pois bem, uma boa notícia: os meus amigos da AEPGA (Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino, vd. aqui) descobriram-na no Planalto de Miranda e multipicaram-na com sucesso.
Esta antiga planta forrageira de proveniência desconhecida, designada na região por "parda" ou "ervilhaca-parda", era cultivada nos solos mais pobres (será tolerante à escassez de fósforo?) para produzir fenos. Mais recentemente, lá para os lados de Mirandela, misturava-se com centeio para melhorar o habitat da perdiz-vermelha. Parece que se enreda nos colmos do cereal, formando uma mata emaranhada que a perdiz aprecia para esconder os ninhos e as crias.


Vicia articulata (Fabaceae). Esta espécie tem uma característica única entre as plantas do género Vicia: as estípulas - i.e. os dois orgãos que ladeiam a inserção da folha no caule - são muito distintas, uma é grande e ramificada (parece uma anémona), a outra pequena e linear (fotos CA)

A extinção de uma espécie, de uma variedade ou de um ecótipo cultivado é, por definição, irreversível. Quem sabe se estas plantas pouco produtivas, adaptadas a solos de baixa fertilidade, não serão fundamentais nos sistemas de agricultura do futuro? Um tema para reflectir com demora no próximo ano agrícola/escolar.
Volto no final de Agosto.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Trifolium suffocatum (Fabaceae)

Os bovídeos (e.g. ovelhas, cabras e vacas) e os perissodáctilos (e.g. cavalos e burros) domésticos têm um efeito devastador nas plantas de que se alimentam.
Por duas razões maiores.
Por um lado são seres insaciáveis. Embora os micróbios que habitam o complexo sistema digestivo dos grandes herbívoros domésticos sejam capazes de digerir a celulose - a molécula mais abundante no reino vegetal - em favor dos seus mamíferos simbiontes, as plantas são alimentos de baixa qualidade e têm que ser consumidas em grande quantidade (e.g. uma vaca consome em média 15 kg de matéria seca/dia) para cobrir os enormes custos energéticos da maquinaria bioquímica animal.
Por outro lado, a boca, a língua e os dentes destes animais são instrumentos maravilhosos de arranque e corte de matéria verde. Percebi isto mesmo quando vi ovelhas a comer rebentos de Genista hystrix - uma giesta de caules rijos e aguçados - sem arranharem o focinho húmido e sensível, burros a deleitarem-se com Rubus «silvas», vacas Barrosãs e Maronesas a consumir com apetite Ulex minor «tojo-molar», e garranos a pastar o assanhado Ulex europaeus «tojo-arnal» sem castigar a boca e a língua. Eu não consigo colher amostras destas espécies sem picar as mãos, quanto mais debicar amoras de silva e cinorrodos (o fruto ...) de roseira com os dentes!

"Rastejar" é uma solução "lógica" para escapar aos efeitos da herbivoria. Mais do que as folhas há que manter bem rentes ao solo os meristemas (aglomerados de células que mantêm a capacidade de se dividir, geralmente situados na extremidade dos caules ou na axila das folhas), as flores e as sementes. Assim acontece em três dos trevos mais conhecidos da nossa flora: o T. subterraneum, o T. glomeratum e o espantoso T. suffocatum.

T. suffocatum, um dos trevos morfologicamente mais originais da flora portuguesa. N.b. hábito prostrado; flores sésseis (sem pedicelo) aglomeradas na axila das folhas; folhas de limbo delgado e pecíolo longo e esguio, energeticamente baratas (fáceis substituir), adaptadas a atravessar densas matas de plantas rasteiras e emergir à sua superfície em busca da luz solar (fotos CA)

Estes três trevos - um trava-línguas para botânicos ;) - juntam o hábito prostrado - supostamente uma adaptação para escapar à herbivoria - com uma razoável resistência ao pisoteio e aos solos compactados: faz todo o sentido.

domingo, 18 de julho de 2010

Antirrhinum linkianum (Plantaginaceae)
















Pensamos que esta belíssima Antirrínea já aqui tinha aparecido, mas parece-nos ser uma boa altura para reaparecer, tendo em conta a curiosidade hoje fotografada!
Este fenómeno (corolas bastante diferentes na mesma planta) será provavelmente devido a uma anomalia de cariz genético, possivelmente uma mutação, assim supomos.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Polygonum bistorta (Polygonaceae)

Faltei seis anos seguidos à chamada da terra dos meus ancestrais maternos: a pequena vila, e grande concelho de Montalegre. Estive pela última vez em Contim no final da década de 90, a pequena aldeia de onde escaparam das tropas francesas e da fome alguns dos meus avoengos barrosões. Já não me lembro quando vi pela última vez uma chega de bois, a vezeira do gado miúdo, um pastor de croça e uma perdiz-cinzenta (sim, vi esta espécie no Planalto da Mourela, era ainda garoto).
Este ano voltei, finalmente; desta vez na companhia de um naipe excelente de botânicos lusitanos e espanhóis.
Foram dois dias intensos, de incessante colheita e observação de plantas. Enquanto vasculhava os urzais-tojais tão característicos da região, recordei uma das minhas primeira experiências botânicas, um dia há  30 anos atrás, quando observava extasiado o delicado esporão de uma Linaria elegans, que chamava de orquídea. No final da jornada, a caminho de Montalegre, vindo de Pitões da Júnias, depois de um tremendo dia de chuva a colher plantas em turfeiras, molhado da cabeça aos pés, lá estava ele, o Polygonum bistorta.


Esta planta de ampla área de distribuição na Europa, em Portugal, tanto quanto sei, só ocorre em Montalegre. Conheço-a de um lameiro na margem esquerda do Cávado, a poucas centenas de metros da ponte de Frades.
As gerações de agricultores, de primeiras e segundas gerações urbanas sucedem-se, mudamos de terra e de profissão, o P. bistorta, porém, persiste impassível, imutável, no seu pequeno lameiro, longe, muito longe, das densas e exuberantes populações centro-europeias da sua espécie.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Argyrolobium zanonii (Fabaceae)

















Continuando na linha dos trevos... este não é bem um trevo, mas também não se afasta demasiado: Argyrolobium zanonii (Turra) P. W. Ball in Feddes Repert. 79: 41. 1968 = Cytisus zanonii Turra (basiónimo), um endemismo mediterrânico cuja distribuição e sinonímia se podem consultar na excelente Med-Checklist, de Greuter, Burdet & Long:
The MED-CHECKLIST
As fotos são do CW calc., onde esta belíssima planta rupícola se pode encontrar nos ricos afloramentos calcários.
Também foi denominado Cytisus argenteus L., Sp. Pl. 2: 740. 1753 [1 May 1753], o que não surpreende muito, tendo em conta o aspecto prateado ou acetinado das suas folhas e das suas vagens. As flores, contudo, possuem um amarelo bem vivo.

domingo, 11 de julho de 2010

Trifolium cernuum (Fabaceae)

A quantidade e a distribuição da precipitação ao longo do ano têm um enorme efeito na composição florística primaveril das pastagens anuais. Este ano as plantas adaptadas a solos temporariamente encharcados foram promovidas em detrimento das espécies mais xerófilas porque choveu intensamente durante toda a estação húmida, e os solos permaneceram húmidos até Junho.
No grupo funcional das leguminosas uma das plantas mais favorecidas neste ano tão invulgar foi este trevo:


Trifolium cernuum, um trevo descrito por Avelar Brotero, fácil de distinguir pelos seus capítulos axilares (localizados na axila de folhas) pedunculados (com um pé), constituídos por flores torcidas para baixo pelos pedicelos

O T. cernuum é uma planta de solos temporariamente encharcados, muito frequente nos anos mais húmidos em pastagens semeadas ou indígenas de trevo-subterrâneo.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Trifolium cherleri (Fabaceae)

Continuamos com os trevos.
Este é um dos meus preferidos:

Trifolium cherleri (Fabaceae)

O nome comum «trevo-entaçado» percebe-se na foto: as flores estão organizadas em inflorescências densas, contidas numa "taça" constituída pelas duas folhas superiores. Suporta razoavelmente a herbivoria, mas tem limites: o T. subterraneum, o T. glomeratum e o T. suffocatum, por exemplo, estão bem mais adaptados a fortes cargas animais. Aqui, em Trás-os-Montes, a presença de T. cherleri é um sinal de abundantes bases de troca no solo (e.g. cálcio e magnésio) e um pH não muito longe da neutralidade, não surpreende por isso que geralmente se faça acompanhar por Medicago sp.pl. (várias espécies de luzerna), Taeniatherum caput-medusae (uma curiosa cevada-brava) e Aegilops sp.pl. (os trigos-de-perdiz, parentes próximos do trigo).

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Rhizocarpon geographicum (Rhizocarpaceae)















O Verão continua e este líquen maravilhoso continua a brilhar nas nossas montanhas siliciosas: Rhizocarpon geographicum (L.) DC., o «líquen-mapa», como aqui se pode confirmar: Map lichen - Wikipedia, the free encyclopedia
No mesmo local pode encontrar-se esta frase espantosa:
«In an experiment, this lichen species was placed in a capsule and launched into space. The capsule was opened, exposing the lichen to space conditions for 15 days before being brought back down to Earth, where it showed minimal changes or damage.»

Este vegetal absolutamente extraordinário encontra-se distribuído pela maior parte do Globo, incuindo terras gélidas como por ex. a Península Antárctica, a Gronelândia ou a Sibéria.
Não sei quanto tempo pode viver este líquen mas suponho que muitos milhares de anos, pois é usado para datar substratos pré-históricos ou medievais (por ex. da "Little Ice Age").
Parece ser sensível à poluição, o que não o impede, contudo, de se encontrar com muita frequência em Portugal ou na Região Mediterrânica.
O basiónimo: Lichen geographicus L.
Para consultar a sinonímia: Rhizocarpon geographicum - Wikipedia, la enciclopedia libre
Consta que cresce em média 0.2 milímetros por ano. As zonas mais escuras em redor das aréolas amarelas correspondem aos esporângios, de acordo com as mesmas fontes enciclopédicas.