sábado, 10 de outubro de 2009

Três notas sobre o castanheiro (Castanea sativa, Fagaceae) I

Choveu finalmente em Trás-os-Montes (NE de Portugal). Ano desgraçado, este. Noutros tempos significaria fome; hoje, desde que haja água na torneira ...
A produção e a qualidade da castanha depende, em larga medida, das trovoadas de Verão. As chuvas de Verão engrossam a castanha, e aumentam o número de frutos férteis por ouriço. O castanheiro foi uma das culturas mais sacrificadas por este ano de seca. Nos soutos abundam as fulecras (frutos sem semente, a parte comestível da castanha, vd. aqui), a produção será fraca.

Muitas árvores mergulham verticalmente no solo raízes profundantes, especializadas na absorção de água, em busca dos lençóis freáticos. As fagáceas são vedoras particularmente eficientes; nos montados, por exemplo, em pleno Verão, por entre as ervas crestadas pelo sol e pela seca, os sobreiros e as azinheiras mantêm, frequentemente, os estomas (pequenos orifícios na superfície das folhas e dos caules verdes) abertos, transpirando grandes quantidades de água. A precipitação invernal é também essencial para o castanheiro - conforme se pôde perceber este ano - porque as águas subterrâneas acumuladas durante o Inverno sustentam as árvores durante o Verão.
Os castanheiros vivem tempos difíceis. Além do escasso reabastecimento dos lençóis freáticos nos últimos Invernos, as águas subterrâneas estão a ser activamente bombeadas para consumo público, ou rega. Consequentemente, muitos castanheiros dos soutos situados nas partes mais altas dos termos das aldeias (= território de uma aldeia) estiveram sujeitas a um stress hídrico acrescido durante todo o Verão. A doença da tinta vai-se agravar nos próximos anos!



Castanea sativa (Fagaceae). N.b. frutos (castanhas) em grupos de três em cada ouriço; os ouriços são deiscentes por quatro valvas; o ouriço tem origem numa cúpula que envolve três flores férteis (ver aqui); na terceria foto a contar do topo (clicar para ampliar) identificam-se no interior do ouriço três cicatrizes, correspondentes a três castanhas [fotos C. Aguiar].

A chuva humedeceu os ouriços e despoletou a deiscência dos frutos (libertação dos futos e consequente queda no solo). Se nas próximas três semanas visitarem um souto ouvirão o restolhar compassado da queda das castanhas no solo. Sem chuva, a deiscência dos frutos, sobretudo em variedades como a 'Judia', estaria em risco. Nos Outonos muito secos os produtores de castanha chegam a pulverizar com água a copa das árvores para facilitar a queda da castanha.
Por estes dias muitos bragançanos estão de férias, e os soutos enchem-se de gente a apanhar a castanha. Mais um mês e colhe-se a azeitona. São estas as duas maiores fontes de renda dos agricultores transmontanos.

3 comentários:

  1. Ainda ontem, num passeio aqui perto de casa (fui mostrar ao Luís a Staehelina que nos ensinaste há duas semanas atrás), reparei nos ouriços vazios de que falas, assim como no pequeno tamanho das castanhas que começam agora a espreitar. Tem sido, realmente, um ano muito seco.

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  2. Como sabem, e são cientistas no nosso clima(mediterraneo) tem ciclos de seca versus ciclos de grande pluviosidade, e neste momento estamos num ciclo de seca que vem desde 2003, espera-se que termine, e que venha o oposto este inverno, e ai nessa parte do território está em seca extrema.

    Exelente discrição do que está acontecer ai em Trás os Montes!

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