terça-feira, 13 de abril de 2010

'A CRIAÇÃO' de EDWARD O. WILSON








Existe uma obra póstuma do ilustre planetólogo Carl Sagan (1934 - 1996): 'the varietes of scientific experience', que reúne um ciclo de conferências compiladas pela sua mulher Ann Druyan, a partir das cassetes então gravadas. É um livro acerca do encantamento e reverência pelo Universo e pela Natureza que decorrem do conhecimento científico. O capítulo final, dedica-o Sagan, a um apelo à união de esforços entre os cientistas e os líderes religiosos para lutar, sem tréguas, contra a perspectiva próxima de uma catastrófica perda de biodiversidade na Terra. O próprio título é uma paráfrase de um famoso tratado de antropologia e filosofia das religiões 'the varieties of religious experiences' de William James (1842 - 1910). A ideia principal de Sagan é que: a diferença cultural entre crentes e humanistas seculares poderia ser ultrapassada, neste particular, a bem de um valor maior de defesa da Vida e catalisada neste propósito a influência que ambas os magistérios têm na Humanidade. Em nome de ser salva a Bioesfera tal como a conhecemos.

É esse mesmo tema que o eminente biólogo, Edward O. Wilson (1929 - ),um dos maiores pensadores científicos do nosso tempo, retoma no seu livro 'A Criação'. Na qualidade de humanista secular e de cientista, dirige-se ao longo do livro, a um pastor evangélico do Sul dos E.U.A, expondo-lhe a maravilhosa diversidade da Vida e a catastrófica ameaça de extinção de um quarto das espécies da Terra, até ao fim do presente século, por via da acelerada e imparável destruição dos seus habitats. Uma imensidão de evidência científica suporta ser a diversidade de seres vivos o resultado do processo de Evolução em alternativa a um acto de um divino demiurgo; mas não é disso que o cientista quer convencer ou debater com o pastor, que acredita na literalidade bíblica da criação ex nihilo.

Apelando à união - neste desígnio - de dois domínios largamente irreconciliáveis por natureza: a Ciência e a religião, como as forças mais influentes na vontade humana, o cientista insta o pastor a juntar-se-lhe e pregar junto dos seus fieis, uma vez mais, o ensejo da salvação. Da salvação da 'Criação'.

10 comentários:

  1. Salvar a 'Criação' é um objectivo muito nobre e muito ambicioso! Esperemos que ainda seja possível!

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  2. Fica aqui uma referência e link para um
    artigo interessante mas pouco animador, directamente relacionado com os problemas acima referidos:

    "US military warns oil output may dip causing massive shortages by 2015
    • Shortfall could reach 10m barrels a day, report says"

    http://www.guardian.co.uk/business/2010/apr/11/peak-oil-production-supply

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  3. Pois. Não é nada de surpreendente. Como já foi várias vezes referido neste blogue pelo CA, uma das alternativas à energia barata, que já pertence ao passado, são as leguminosas fixadoras de azoto.

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  4. E.O. Wilson não está só na tentativa de envolver as religiões na conservação do habitat humano, e da "criação" biológica. Daniel Dennett alinha com E.O. Wilson, logo nos primeiros capítulos do "Breaking the Spell: Religion as a Natural Phenomenon", de 2006. Richard Dawkins, no mesmo ano, no "The God Delusion", tem uma posição radical anti-religião, oposta à do seu amigo D. Dennett. O debate está aceso, e os livros sobre o impacte da ideia de Deus, nas sociedades humanas, e no biota terráqueo sucedem-se (uma pequena busca na Amazon é elucidativa). Pessoalmente, simpatizo com o sistema de ideias D. Dennett e de E. Wilson: a religião tem um importante papel a desempenhar na crise ambiental (inc. diversidade biológica) e de recursos, presente e futura. No fim de contas a religião não confortou e orientou as almas noutros tempos de crise? E não foi pouco, assim nos conta o meu quase conterrâneo Idácio, bispo de Chaves.

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  5. Jorge, há quanto tempo que não te víamos por aqui ;)

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  6. Pois, é sempre um prazer rever por aqui o Jorge!
    E esperemos que as leguminosas fixadoras de azoto possam dar um contributo energético significativo. Na verdade já dão, pois as Leguminosas estão, sem dúvida alguma, entre os melhores alimentos que nos fornecem a energia vital para o nosso funcionamento!

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  7. Entretanto, é pena termos tão poucos anos para serem postas em prática as de alguma forma inevitáveis reconversões energéticas...

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  8. Desculpem a ausência, mas os afazeres familiares e os profissionais não dão tréguas...

    Quanto ao Daniel Dennett, em 'Breaking the Spell'parece sugerir que os religiosos têm mais filhos, logo a religião é favorecida pela selecção natural. Tudo o resto começa na nossa tendência inata para personificar e reconhecer intenções nas outras entidades (intentional stance fide D. Dennet) e vai por aí fora em termos de evolução cultural do meme religioso. muito interessante. Já vou na 2ª leitura por acaso.... :-) Não querendo introduzir o tópico aqui, direi apenas que sou tão anti-religioso como o Dawkins. Estou convencido que é algo prejudicial à Humanidade (por favor não vamos discutir isto aqui, a ideia não foi essa). No entanto, sendo nós todos irmãos, crentes e não-crentes, temos esta obrigação colectiva de guardiões para com a 'Criação', seja como for que a entendamos.

    Abraço a todos.
    JC.

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  9. Pois a mim parece-me, independentemente de factores religiosos, a biodiversidade está severamente comprometida, pois a luta pela sobrevivência será predominante e a nossa espécie, para além de muito numerosa, é muito adaptável e eficiente...

    Abraço a todos,
    ZG.

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  10. Não li nenhum dos livros, mas tenho-os na minha lista para ler há já desde algum tempo. Seja-se ou não religioso, acho que o envolvimento dos líderes religiosos poderia trazer grandes benefícios à causa da conservação. Por acaso, um dos livros que estou a ler neste momemento ("Como Comemos", de Peter Singer e Jim Mason) tem uma passagem interessante, precisamente sobre este assunto, apesar de direccionada para o tema do livro, que é a alimentação:
    "Tendo em conta a forte preocupação britânica com o consumo ético, dificilmente surpreende que Rowan Williams, arcebispo da Cantuária, se tenha tornado o primeiro líder cristão importante a afirmar que a ética se estende às escolhas alimentares. Sob a sua liderança, a Igreja Anglicana publicou um relatório intitulado «Partilhar o Planeta de Deus» que recomenda o consumo sustentável e afirma que todos os cristãos têm o dever de «cuidar de todas as partes da criação de Deus». A Igreja recomenda que os próprios padres façam escolhas de consumo amigas do ambiente, vendendo produtos de comércio justo nas festas de igreja e usando pão e vinho orgânicos na Comunhão".

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