"...
Dois meses depois Amaro foi nomeado pároco de Feirão, na Gralheira, serra da Beira Alta. Esteve ali desde Outubro até o fim das neves.
Feirão é uma paróquia pobre de pastores e naquela época quase desabitada. Amaro passou o tempo muito ocioso, ruminando o seu tédio à lareira, ouvindo fora o Inverno bramir na serra. Pela Primavera vagaram nos distritos de Santarém e de Leiria paróquias populosas, com boas côngruas. Amaro escreveu logo à irmã contando a sua pobreza em Feirão; ela mandou-lhe, com recomendações de economia, doze moedas para ir a Lisboa requerer. Amaro partiu imediatamente. Os ares lavados e vivos da serra tinham-lhe fortificado o sangue; voltava robusto, direito, simpático, com uma boa cor na pele trigueira.
..."
[Eça de Queiroz, O Crime do Padre Amaro]
Ontem andei pelo Montemuro (Beira Alta).
Na aldeia da Gralheira, concelho de Cinfães, mesmo ao lado da Feirão do Padre Amaro, por lá continuavam os mesmos velhos de sempre, de cajado na mão e pele arrepanhada pelo frio, a gozar a volta do sol. Apressados, mas, suponho, com pouco que fazer, circulavam rostos femininos escondidos sob a capa burel, ataviados com a tradicional roupagem preta, mas de botas revestidas com pêlo por dentro, bem diferentes das socas de madeira de antigamente. À saída da aldeia um ou outro pastor vigiava com displicência pequenos rebanhos de arouquesas pachorrentas, a enfardelar com avidez os primeiros rebentos de final de Inverno. A ovelhas circulavam mais longe, para os lados da Lagoa de D. João, ou mais alto na serra, em redor das penedias graníticas.
Ao contrário do que seria esperar numa terra tão agreste e distante dos grandes centros, senti as gentes felizes, despreocupadas, bem. O contentamento circula por aquelas ruas de séculos maceradas pelo gelo e pelo vento. Este vento que penetra até aos ossos, a detestada ventania de Inverno é afinal a causa de uma súbita regeneração. A serra povoou-se de gigantescos moinhos de vento. Fantásticos geradores eólicos com pás de 40 m produzem electricidade dita renovável, e uma renda fixa que pinga em contínuo nos bolsos dos proprietários do monte que até há bem pouco tempo ninguém consegui a vender. Bem melhor do que o subsídio da CE ou o borrego de final de Outono! Com a nova indústria vieram mecânicos, electricistas, engenheiros e até turistas da grande cidade para quebrar a solidão do defeso invernal. Nunca faltam clientes no restaurante da aldeia, com prato do dia e onze empregados a tempo inteiro. Os migrantes de primeira e segunda geração recuperam palheiros e casas devolutas para gozar a reforma quantas vezes oferecidas ao virar os cinquenta. Alí ao lado, em Campo Bem-Feito, instalou-se um grupo profissional de Teatro. A Câmaras Municipais, com as rendas das eólicas, mantêm as estradas impecáveis. As carreiras de passageiros levam e trazem os garotos para os novos centros escolares com aquecimento central e cantina, professor de ginástica e de inglês.
Outro tempos aqueles a que Eça se refere no capítulo terceiro do "Crime do Padre Amaro"!
Parou de chover há três dias e os fogos despontaram, automaticamente, pela mão dos pastores, um pouco por toda a Serra. Melhor agora do que no pino de Verão. O solo está húmido e as plantas continuarão dormentes à espera dos calores de Primavera. Estes fogos frios e "ajardinados" são uma prática tão antiga como necessária. A palhuça seca de Agrostis x fouilladei, Molinia caerulea ou de Arrhenatherum elatius subsp. bubosum que por ora cobre a serra de pouco serve: é o pão seco e bafiento do animal. Os tapetes densos de Halimium ou as toiças envelhecidas de Ulex minor «tojo-molar» atrapalham a circulação dos animais e retiram espaço à forragem. Uma pequena carqueja aqui, um pequeno giestal acolá, tudo somado dá muito fogo que não entra nas estatísticas, que escapa à atenção de jornalistas e analistas, mas que regenera o pasto e dá de comer aos rebanhos. Nas áreas queimadas, a partir da Primavera os rebentos túrgidos de proteína do Ulex minor podem ser pastados com proveito e compensar a fibra bruta das gramíneas do monte. Um fabuloso endemismo regional, a Armeria beirana, também é beneficiado pelas "limpezas" de Inverno de potenciais competidoras. Os bosquetes de carvalho-negral (Quercus pyrenaica) suprimem o fogo e lucram com a eliminação dos arbustos de Erica arborea que lhe consomem a luz. Se é certo que o fogo pode atrasar a regeneração do bosque também é verdade que a não impede. Cada vez que vou ao Montemuro vejo mais árvores.
Os fogos violentos de Verão, esses sim, são indesejáveis e um produto da modernidade.
Está fantástico Carlos!
ResponderEliminarBem, compreende-se que algumas das razões para o êxodo rural já não estão presentes nestes territórios... Chegou a altura de repovoar Portugal e aproveitar todo o seu potencial... D. Sancho I rejubila.
Há que recuperar o "Fugere urbem" de Horácio e dos arcadistas e pô-lo finalmente em prática...
Abraço.
Muito interessante - texto e imagens!!
ResponderEliminarUm dia farei também esse retorno :)
ResponderEliminarAbraço
Vasco
Esta paisagem é um bocado onírica. Um mundo de diferença aqui para o sul.
ResponderEliminarBelas fotos e excelente texto. Transporta-nos para uma realidade muito diferente. Como é possível tanta diversidade, a todos os níveis, num país tão pequeno.
Um abraço!
Portugal não é um país pequeno - tem 92090 km2 ou 35645 sq mi
ResponderEliminarPortugal - Wikipedia, the free encyclopedia
ou ainda 9209000 hectares - mais de nove milhões de hectares!!!
Um abraço!
Também me parece uma paisagem esplendorosa e verdadeiramente onírica!!!
ResponderEliminarPara acompanhar vou sugerir uma das pérolas ambientais do genial Brian Eno:
YouTube - 1/1 Brian Eno
Não deixa de ser engraçado que a última vez que visitei estas paragens tive uma ideia completamente contrária. A desertificação pareceu-me substancialmente maior do que a que encontro na região de Bragança, onde eu e o Carlos Aguiar vivemos, e o abandono agrícola e o envelhecimento da população é muito superior. Aliás basta ver os dados demográficos e o censo agrícola de 2009, para verificar isso.
ResponderEliminarO argumento das eólicas para justificar a riqueza que não existe é ainda menos consistente. Os engenheiros e os mecânicos não existem para além do período de instalação (ver este artigo do público http://jornal.publico.pt/noticia/30-01-2011/a-factura-da-electricidade-e-a-sustentabilidade-economica-de-portugal-21160930.htm).
A produção de energia renovável é uma boa aposta, mas quando é feita sem planeamento e num constante "vale tudo" acaba por ter efeitos mais nefastos do que benéficos. O fim em si é bom, os meios utilizados é que estragam tudo.
Num blog de botânicos não deixa de ser triste que se faça alguma apologia acrítica e "naïf" das eólicas quando esta indústria, ou o modo "selvagem" como proliferou, é responsável pela maior destruição de valores botânicos únicos: os vales do baixo Sabor e do Tua e agora o vale o Tâmega. As eólicas não vivem sem barragens que possa acumular energia por elas produzida (barragens com embalse e contra-embalse ou em cascata) e por isso a construção destas barragens é uma resposta necessária para encaixar a proliferação desenfreada desta indústria.
Além do mais, tem outros problemas de gestão energética e de economia que são mencionados no artigo acima citado.
Às vezes aquilo que parece não é...
Luís Moreira
Viva Luís.
ResponderEliminarO despovoamento que existe no Montemuro, não será significativamente diferente daquele que existe nas aldeias igualmente hiperperiféricas de Bragança, tais como Varge, Deilão, Guadramil, Rio de Onor etc. É disto que se trata: o Montemuro referido neste artigo é o hiperperiférico... A riqueza a que o Carlos se refere existe e começa a ser visível (eu moro cá pelo Montemuro) e tem que ver com o aluguer dos terrenos privados e dos baldios. É óbvio que o afluxo de trabalhadores é elevado durante a instalação, mas vejo muito frequentemente trabalhadores de manutenção em parques já instalados. São pessoas que, de outra forma, não se deslocariam à serra e que, além de fazerem a manutenção dos aerogeradores... perturbam o lobo...
O artigo do Público que refere é, como se compreende, um artigo político. As energias ditas renováveis não servem para diminuir a nossa dependência do petróleo, obviamente. Mas sim para reduzir a nossa dependência energética: o carvão e o gás natural são igualmente importados. A energia do vento é incerta, irregular, mas quando o vento sopra enfia-se menos carvão e injecta-se menos gás nas centrais de produção de energia. Se a poupança justifica o investimento em aerogeradores é outra conversa... mas são números que não possuo.
Julgo que tem toda a razão quando aponta a falta de planeamento e a forma selvagem como proliferaram os parques eólicos. É preocupante. Há interesses instalados, muito provavelmente corrupção, muitos atropelos à propriedade e sobretudo à distribuição justa dos proveitos (como aliás é usual no nosso e em tantos outros países, muitas vezes com culpa do próprio povo, que por um lado se conforma perante o abuso e, por outro, que se cala quando o vento lhe é favorável).
É verdade que as barragens do Sabor, Tua e Tâmega prevêem a bombagem de água de volta para as suas albufeiras. No entanto, achar que esta é a justificação para não se instalarem mais aerogeradores no país é que me parece uma posição um pouco acrítica e ingénua, que indeliberadamente encarreira com os defensores da nuclear... As eólicas vivem perfeitamente sem barragens (veja-se esta notícia, também do Público, onde se compreende que num ano ventoso o consumo de energia de origem eólica foi grande... ainda sem as referidas barragens construídas: http://economia.publico.pt/Noticia/portugal-e-o-segundo-pais-do-mundo-com-maior-peso-das-eolicas_1416469), desperdiçam é energia, se se tiverem de desligar por não haver escoamento da sua energia. A decisão de construção daquelas barragens é, feliz ou infelizmente, política.
É conhecida a vontade do autor do artigo que referiu em trazer a energia nuclear para Portugal (http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?fokey=ex.stories/621122&p=stories&op=view&uop=userlogin) e, tal artigo serve apenas a esse propósito político. Escuso-me a repetir a sua última frase, pois poderia levar-me a mal e não é essa a minha intenção... apenas contribuir para esta interessante discussão.
Tiago
Caro Tiago
ResponderEliminarA motivação dos autores do tal artigo é irrelevante para os factos que apresentam. A energia eólica tem como enorme desvantagem a dificuldade de gestão da rede eléctrica - é um facto. Pensar que algum promotor deste tipo de empreendimento desliga os aerogeradores e deixa de injectar energia na rede é outra ideia ingénua acerca da energia eólica, da forma como são estabelecidos os contractos com o Estado e da viabilidade deste tipo de empreendimentos.
A minha afirmação acerca do Sabor, Tua e Tâmega baseia-se nos documentos apresentados pelo Governo português à UE para justificar a construção dessas mesmas barragens. Está lá preto no branco. Documentos que foram alvo de peritagens por especialistas em energia e que de forma alguma colocaram em causa essa justificação. Para além disso, basta falar com algum técnico da área de energia que trabalhe sobre gestão de redes energéticas para perceber o porquê das barragens.
Acho que deve haver aproveitamento da energia eólica, mas com planeamento e não do modo selvagem a que se assiste; tão selvagem, que até alguns técnicos que trabalham para os promotores deste tipo de energia se queixam!
Quanto às aldeias de Montemuro e de Bragança, mantenho exactamente o que disse e apenas altero a minha opinião quando for confrontado com dados estatísticos que demonstrem o contrário. Até lá, é apenas uma questão de diferente percepção.
As vantagens atribuídas pelo movimento de trabalhadores dos parques eólicos fazem-me lembrar o que os adeptos das barragens e da caça também apresentam, ou apresentavam, como vantagens para o desenvolvimento destas actividades. Se assim fosse, ou pelo menos fosse significativo, onde havia barragens ou caça haveria mais riqueza do que nas regiões onde não estão presentes. Mais uma vez os dados do INE não parecem apontar nesse sentido.
A única vantagem que vejo para algumas populações locais (não todas) e para alguns particulares são as rendas. Pena é que a conservação da natureza, ou os serviços que a conservação da natureza proporcionam à sociedade não sejam pagos da mesma forma. Bastá só pensar quanto valeria a formação de solo. Nalguns casos, estes serviços nem seriam incompatíveis com a energia eólica... Não é que trouxesse desenvolvimento às áreas classificadas, mas eram pagamentos mais que justos.
Por fim a capacidade de percepção - o que parece - é importante. Rio de Onor e Guadramil já não têm rebanho de ovinos ou caprinos e poucas ou nenhumas vacas. Também não têm campos de cereais e pior não têm crianças. Pelo contrário, Deilão e Varge têm rebanhos de ovinos e vacas (bastantes no caso de Deilão), muitos campos de cereal com rotação anual de grandes folhas e ainda têm garotos, embora já não tenham as escolas da aldeia a funcionar. Colocar as 4 aldeias no mesmo saco leva-me a questionar a capacidade de percepção do observador, pois são estádios de "êxodo rural" muito diferentes.
Luís Moreira
Caro Luís:
ResponderEliminarRespondo por pontos tentando não me alongar demasiado, o que me é sempre difícil.
Parece-me que estamos de acordo nos seguintes pontos:
1. A energia eólica torna a gestão da rede mais complexa.
2. O governo aponta como uma justificação para a construção das barragens a gestão da energia eólica produzida. (Mas não esqueçamos que há mais justificações – ver ponto 6. - e que às vezes os governos são criativos.)
3. O modo selvagem como proliferaram parques eólicos; atropelando sobretudo os direitos dos proprietários.
4. O arrendamento dos terrenos é, de facto, a grande vantagem para algumas populações e particulares. Mas creia que as gentes destas terras ermas gostam de ver o técnico da manutenção e de, eventualmente, servir-lhe o almoço...
5. É provável que o Estado e a UE tenham exagerado nos apoios à energia eólica, anda por aí muito dinheiro no ar; mas como o dinheiro tem de vir de algum lado, é natural que se reflicta na factura da electricidade.
Parece-me, no entanto, que discordamos nos seguintes aspectos:
6. Há outras razões, de peso, (cuja validade podemos igualmente discutir) que o governo aponta para a construção das barragens e que são até do domínio público: i) aproveitamento do (subaproveitado) potencial hidroeléctrico do país; ii) diminuição da dependência energética e iii) diminuição da emissão de gases que potenciam o efeito de estufa. Eu, pessoalmente, diria até que o argumento das eólicas é o menos “pesado”...
7. A rede energética nacional não acumula energia! Por isso, quando o consumo não dá vazão à energia que se está a produzir, as turbinas (produtoras) começam a rodar cada vez mais rápido. Isto acontece porque, quando o consumo cai, diminui a resistência electromagnética na turbina. Se a queda de consumo for tão brusca, que não dê para responder diminuindo a produção de vapor (como no caso de um apagão grande), as turbinas das centrais termoeléctricas podem mesmo ter de desligar, por razões de segurança. Acontece o mesmo com as eólicas: se o vento for jeitoso e se não houver consumo na rede, pode crer que o melhor é diminuir a inclinação das pás, ou mesmo desligá-las! Se não houver consumo, não se injecta nada na rede. (Vivi muitos anos com um técnico de produção e gestão de energia em casa.) Confesso que tenho alguma curiosidade em saber quanta energia eólica é que verdadeiramente se desperdiça, ou não se aproveita... suspeito que não seja um maná, e parece-me ainda menos aquela que se reaproveitará com as barragens... Parece-me, por tudo isto, que não se deve concluir que é por causa das eólicas que se destruirá a flora do Sabor e do Tua. Acho que o artigo que enviei é claro no que respeita à possibilidade de se consumir muita energia eólica, mesmo sem as tais barragens construídas...
(continua)
8. Conheço muito bem Rio de Onor, Guadramil, Varge e Deilão. A minha mulher estuda a área e visitámo-las várias vezes nos últimos anos. Rio de Onor, apesar de, infelizmente, ter perdido o rebanho comunitário há uns meses, ainda tem quatro vacas e dois agricultores com cerca de oito ovelhas cada (uma miséria eu sei!), disse-me o Sr. António Preto. Guadramil é sem dúvida a mais despovoada: a última vez que falei com o Sr. Zé “Gago” a tristeza por não haver jovens (já nem se tratava de crianças!) era grande e havia apenas algumas vacas na aldeia, que estavam até para ser vendidas... Em Deilão sei perfeitamente que a situação é diferente, há muito mais gente e muito mais gado: lembro-me da manada da Sr.ª Olívia, que pude ver a pastar enquanto a minha mulher recolhia dejectos de cervídeos. Varge, além de ter também alguma gente, tem aquela dinâmica fantástica com o restaurante “O Careto” (E que simpáticas e hospitaleiras as senhoras de lá!).
ResponderEliminarCom isto, espero ter eliminado a suas dúvidas em relação à minha capacidade de percepção sobre as aldeias referidas.
Agora vamos às aldeias hiperperiféricas do Montemuro:
Sabe que Guadramil me lembra o Rossão, onde já só há três crianças?
Sabe que Deilão me lembra Cotelo, onde ainda há muita gente e gado (ovelhas, vacas) e muita cultura de centeio?
Sabe que Varge me recorda a Gralheira, ainda com alguma gente e os seus dois restaurantes “Recanto dos Carvalhos” e “Encosta do moinho”?
Sabe ainda que Rio de Onor me recorda Campo Benfeito... por terem dinâmicas turísticas semelhantes? (Ali por ser fronteira, terem turismo rural e campismo; aqui por terem a companhia de teatro e seu festival anual, cooperativa de artesanato e também turismo rural.) Em Campo Benfeito, ainda assim, há crianças e aumentaram de uma para 13 nos últimos 12 anos! Viva o repovoamento!
Curiosamente, as populações destas aldeias são também semelhantes, variando entre a meia centena (ou nem chegando) nas mais despovoadas e as duas centenas nas mais populosas (veja os censos de 2001).
Por todas estas razões afirmei, que, no que refere a estas regiões hiperperiféricas, o despovoamento não será significativamente diferente entre elas (parecem-me aldeias hiperperiféricas de dimensão e dinâmica semelhantes, só isso...).
Por fim, alerto ainda para o seguinte: Enquanto que a densidade populacional (que obviamente não mede o despovoamento, mas que é relevante para a percepção que temos do território) das freguesias do topo do Montemuro ronda os 15 a 25 habitantes por km2, a das freguesias brigantinas ronda os 3 a 5 habitantes por km2. (Veja-se na Wikipédia, relativamente aos dados dos censos de 2001.)
Respondo-lhe com este detalhe e cuidado, pois este blog, não estando obviamente livre de erros e falhas, é escrito por pessoas (e em particular o autor do artigo “Bem-vindos à Gralheira”) com elevado espírito crítico e científico, que primam pelo rigor e consistência daquilo que escrevem, pelo que confesso que o seu comentário inicial não me parece adequado.
Tiago
Caro Tiago
ResponderEliminarComo estamos de acordo com os pontos 1 a 5, passo então ao ponto 6. O governo aponta mais razões, mas isso não invalida que as eólicas sejam uma razão importante para o baixo-sabor, o tua e o tâmega. O Plano Nacional de Grandes Barragens tinha mais alternativas e as escolhas tiveram razão de ser (nos dois últimos casos). Por outro lado, contrariamente ao que era esperado na mudança de governo psd para ps, o baixo-sabor nunca foi parado porque foi considerado peça essencial do mix das renováveis para precisamente poder absorver os picos produzidos pelas eólicas.
Quanto ao ponto 7 não me parece que quando há excesso de produção eólica se desliguem as pás. Há uma potência contratada e essa é injectada. Até porque se não se apanha este vento ninguém garante que venha outro. Não é como o gás natural armazenado, ou, em menos extensão, como a água armazenada.
Quanto ao ponto 8 dá-me uma certa razão, já que acaba por admitir que misturou aldeias com população e actividade agrícola bem diferente. Embora não entenda o conceito de hiperperiféricas, deduzo que se refira à distância. Bragança é um concelho bastante grande e embora tenha algumas aldeias que possam fazer lembrar montemuro, a grande maioria das suas aldeias tem uma actividade agrícola e pecuária bastante maior daquela que se pode observar em montemuro. Com muito mais gente a sair com os rebanhos e com as vacas, com muito mais campos de cereal, com muitos mais soutos e muitos soutos novos, com muito mais olival e muito olival novo, ainda com os melhores lameiros bem aproveitados. Nota-se a época da segada do feno, do cereal, da apanha da castanha, da azeitona, etc. É essa a percepção que tenho.
A densidade populacional é obviamente um mau índice para medir despovoamento. Quando falamos de freguesias com área gigantescas e que sempre tiveram comparativamente baixas densidades populacionais, mesmo quando estiveram cheias de gente, pode-se ficar com uma percepção errada do território.
Quanto ao elevado espírito crítico e científico de quem escreve no blog não me parece que possa ser colocado em causa quando se faz uma observação discordante a uma ideia que foi colocada pelo Carlos Aguiar: a vinda da energia eólica deu nova vida à Gralheira.
Mesmo quando lamento que se faça a apologia de um modo tão simples e linear de uma industria de produção energética que indirectamente acaba por destruir alguns dos vales mais belos do Nordeste de Portugal e que encerram uma riqueza botânica ímpar, não acho que se coloque em causa o elevado espírito crítico e científico de quem escreve no blog.
Se quiser posso deixar de fazer comentários para evitar que sejam eventualmente desadequados.
Continuo a ter enorme prazer apenas lendo os posts que pretendem divulgar factos simples sobre as plantas e as suas comunidades, por vezes com uma pitada de "hard science".
Luís Moreira
Caro Luís:
ResponderEliminar6. Julgo que compreendeu que, como referi, há outras pesadas razões para construir as barragens que refere. É claro que a optimização da utilização da energia eólica terá influenciado a decisão... mas... suponhamos que não existia potência eólica instalada... não teria o governo, na sua decisão política, optado igualmente pelos três afluentes do Douro que refere, apenas por se tratarem dos que apresentam maior caudal? Não pense que defendo ou estou contra as barragens... não é disso que se trata. O que não compreendo é a sua afirmação de que as eólicas são responsáveis “...pela maior destruição de valores botânicos...”. Acho esta frase desprovida da relação de causa-efeito e já lhe apresentei argumentos para tal. Ainda assim discordamos. Não há nenhum mal nisso; teremos fundos de conhecimento diferentes que nos levam a isso.
7. Não se tratava de desligar as pás... Quando há excesso de energia na rede diminui-se a inclinação das pás, desaproveitando-se vento, e em caso de consumos muito baixos ou zero – o exemplo do apagão - aí sim, pode convir desligar o aerogerador por razões de segurança). Aconselho-o a consultar um técnico de gestão/produção de energia, para averiguar a veracidade dos argumentos que lhe expus. Pela afirmação que faz, nunca haveria necessidade de armazenamento nas barragens que refere, uma vez que a energia seria sempre escoada...
8. Usei hiperperiféricas para qualificar áreas que, além de estarem já em regiões periféricas (longe dos grandes centros urbanos e de decisão nacionais), estão também distantes das sedes de concelho ou de distrito respectivas. Eu não lhe dou razão, nem misturei nada! Referi-lhe quatro aldeias vizinhas do Montemuro (área tratada no artigo do Carlos) e quatro aldeias vizinhas de Bragança. Ambas hiperperiféricas (no sentido que acima explicitei). Demonstrei-lhe, como aliás pediu, referindo-lhe os dados do INE e com base nos inquéritos que fiz e faço quando por elas passo, que são realidades comparáveis e cujo despovoamento não é significativamente diferente (embora que, se formos por sensações, até me parece ligeiramente maior nas aldeias de Bragança...). Compare-se o comparável! No Montemuro do artigo em apreço, as oliveiras nem vegetam! Está-se entre 1000 e 1381 m. Se quisermos ir ao despique sobre áreas onde o abandono agrícola não ocorreu, então eu jogo a cartada de Lamego (falda NE da Serra do Montemuro, um dos quarto concelhos presentes na dita serra). Deve ser difícil, em Portugal continental encontrar densidades de área agrícola semelhantes...
Por fim, é claro que vozes discordantes são sempre bem-vindas! É também assim que se aprende e se melhora. Com “não me parece adequado” não me referia obviamente à discordância, mas sim a afirmações como “O argumento (...) é ainda menos consistente...”, “...não deixa de ser triste que se faça alguma apologia acrítica e ‘naïf’...”, “...leva-me a questionar a capacidade de percepção do observador...”. Mas ainda assim, não creio que a desadequação destes seus comentários seja suficiente para lhe tolher a liberdade de expressão! Mas compreenda que, injustamente, ferem quem leva isto a sério e um pouco a peito.
Tiago
Caro Tiago
ResponderEliminarOs argumentos por ambos postos nestes comentários, parecem-me já ser suficientes, para quem quiser fazer a sua própria apreciação da afirmação feita pelo Carlos Aguiar acerca da indústria da energia eólica ser a causa de uma suposta regeneração da região da Gralheira. E aqui quero realçar "da afirmação" feita pelo autor e não "do autor", já que a dada altura, ao referir o elevado espírito crítico e científico dos autores do blog, parecia que estava a querer dizer que eu colocava em causa o autor e não aquela sua afirmação. E não duvidando que os autores do blog primam pelo rigor e pela consistência, a verdade é que nem sempre isso acontece, o que é natural. Daí a minha discordância, porque não me parece que a referida afirmação tenha rigor e consistência. Já vi que não concorda e expôs a sua argumentação.
Por outro lado, a forma como foi abordada a vantagem do aproveitamento da energia eólica pareceu-me bastante naïf e acrítica, porque não referiu as desvantagens, sendo que uma delas é a necessidade de encaixe da produção da energia nas horas de vazio e super vazio, durante a noite, encaixe esse que é feito através da bombagem para montante em barragens como o baixo sabor, tua e cascata do tâmega. Vales esses que encerram valores botânicos excepcionais.
Por fim, não deixo de registar que não crê que a desadequação dos meus comentários seja suficiente para me tolher a liberdade de expressão, o que quer dizer que se a achasse suficiente, esta seria "tolhida".
Por mim, isso é mais que suficiente para não voltar a fazer quaisquer comentários, pelo que a partir de agora serei apenas leitor, sem que com isso esmoreça o meu interesse.
Luís Moreira
Caro Luís:
ResponderEliminarFoi com pena que li o seu comentário. Até porque, nas mensagens que trocámos, houve espaço para discutir e se argumentar sobre questões relevantes, bem como partilhar pontos de vista distintos.
Talvez não tenha compreendido bem as minhas últimas afirmações, mas a escrita tem destas coisas. O que elas significavam é que, no meu parco entender, o que tinha dito não era assim tão duro para que, como referiu, deixasse de comentar o “blog”. Aqui não há censura! Nem eu sou juiz, nem polícia, para lhe tolher tal liberdade! Também não tenho qualificações de conselheiro, mas talvez não seja necessário, nem tão producente, qualificar depreciativamente os argumentos alheios. Bastará a sua discórdia e contra-argumentação; tal como disse, os leitores saberão fazer as suas apreciações e retirar as suas conclusões.
Por favor, sinta-se sempre à vontade para discordar e contra-argumentar!
Espero voltar a lê-lo por aqui e que torne a contribuir para temas tão quentes como este, que sem dúvida interferem na nossa vida e mexem connosco.
Tiago
Caro Tiago
ResponderEliminarPeço desculpa por não ter entendido bem o que disse. Assim sendo, pode contar com os meus comentários. Aliás, aproveito para fazer, não um comentário, mas uma sugestão, de um tema completamente diferente deste, para futuros posts:
tenho observado que as abelhas estão, nesta altura, a entrar nas colmeias com um pólen amarelo claro, que penso que será de amieiro e/ou de freixo. Nos apiários localizados entre os 450 e os 600m de altitude no vale do sabor, para além de pólen desta cor, também estão a entrar com pólen avermelhado mas em menor quantidade. Também estão já a armazenar algum néctar. Por isso, acharia interessante um post sobre florações, pólen e nectários disponíveis para os insectos nesta altura do ano.
Luís Moreira
Caro Luís:
ResponderEliminarObrigado pela resposta e sugestão.
Esperemos que algum dos colaboradores se entusiasme pelo interessante tema que propõe.
Até breve,
Tiago