domingo, 7 de março de 2010

A marcescência das folhas em Quercus pyrenaica (Fagaceae)

Na pouca botânica que se ensina na escola portuguesa, repetem-se, pelo menos em três anos distintos, os conceitos de caducifolia e de perenifolia. Os livros-texto escolares consideram caducifólias as plantas que perdem as folhas no Outono; a perenifolia é exemplificada como sendo o oposto de caducifolia. No Brasil ensinar-se-á, suponho, que as folhas das plantas caducifólias tombam no solo, quase em simultâneo, no início da época da seca. O conceito de caducifolia é afinal um pouco mais lato: nas plantas caducifolias a copa está despida de folha na estação desfavorável, que poderá ser a mais fria ou a mais seca do ano.
Nos dicionários de botânica encontram-se dois outros conceitos relacionados com os anteriores: semi-caducifolia e marcescência. As plantas semi-caducifólias perdem parte das folhas na estação desfavorável, permanecendo algumas delas funcionais, verdes, portanto. De acordo com esta definição, o
Quercus faginea subsp. broteroi «carvalho-cerquinho» e algumas populações portuguesas de Quercus robur «carvalho-roble» são semi-caducifólias. Nas plantas ditas marcescentes as folhas secam na copa e aí ficam, secas e pendentes, até ao início da estação favorável.

Diz-nos o livro "Los Bosques Ibéricos: una Interpretación Geobotánica" (Costa Tenório et al., 2001) que o Quercus pyrenaica (Fagaceae) «carvalho-negral» é uma planta marcescente.
Observem as imagens:


Quercus pyrenaica (Fagaceae) [as duas fotos mais pequenas foram tiradas na semana passada a caminho de Miranda do Douro, respectivamente em Ifanes (Miranda do Douro) e em Moveros, Espanha ; fotos CA]


A marcescência no Q. pyrenaica tem que se lhe diga.
As plantas jovens de Q. pyrenaica são marcescentes, muito bem. As plantas adultas, pelo contrário, são caducifólias, ou parcialmente marcescentes. Nas árvores representadas nas fotos, a parte superior da copa está despida de folhas, enquanto os ramos inferiores ou os rebentos de raiz (poulas radiculares) continuam revestidos de folhas. Aparentemente, as folhas secas persistem nos ramos juvenis (mais próximos do colo da árvore e que não produzem fruto), e caem dos ramos adultos (afastados do colo e que produzem fruto) no Outono.
E por que retêm as folhas os ramos juvenis de Q. pyrenaica?
Vêm-me desde já à ideia três hipóteses: 1) as folhas secas reduzem os efeitos das geadas, uma protecção importante para os ramos de pequeno diâmetro, e casca delgada, situados próximo da superfície do solo; 2) os Q. pyrenaica arbustivos e de pequeno porte competem ferozmente com os arbustos altos (e.g. Erica arborea e Cytisus), como Q. pyrenaica inicia o seu ciclo vegetativo muito tarde, é capaz de ser "boa ideia" dificultar o acesso dos competidores mais directos à luz do sol; 3) a marcescência é um carácter neutral, sem uma função clara, pelo menos na actualidade.
Provavelmente já alguém estudou o fenómeno. Senão, aqui fica uma deixa para uma bela tese em ecologia evolutiva.

6 comentários:

  1. Belíssimas imagens de carvalho negral!
    Entretanto, ocorreu-me que esta associação
    Genisto scorpii-Cistetum laurifolii
    (Cistion laurifolii, Lavanduletalia stoechadis, Cisto-Lavanduletea)
    Addenda to the Syntaxonomical checklist of Spain and Portugal [1_07]
    poderá talvez ocorrer nos arredores de Bragança (por ex. no excelente carvalhal de S. Bartolomeu)?

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  2. ...Aliás, queria dizer: nas margens do excelente carvalhal de S. Bartolomeu...

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  3. Não me parece. A Genista scorpius é uma planta páramos castelhanos, residual em Portugal.

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  4. Nesse caso, retiro a minha modesta sugestão!

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  5. A propósito deste tema, dia 20 de Março fui a Picão (Castro Daire), à Mata do Bugalhão, apanhar pequenos exemplares de Q. robur para plantar no dia da árvore e pude observar o mesmo fenómeno (marcescência, sobretudo na base da planta) em Quercus robur (e até residualmente em Castanea sativa).
    O bosque em causa estende-se prolongadamente por uma encosta da serra do Montemuro, desde o andar supratemperado inferior (onde já só se encontra Q. pyrenaica) até ao andar mesotemperado inferior. Sobretudo neste último, observam-se já alguns exemplares de Q. robur semicaducifólios, misturados com outros de folha marcescente (outros até sem folha nenhuma, mas já estamos na primavera e as marcescentes acabam por cair).
    Acrescentaria, como factor explicativo adicional para o caso das folhas marcescentes se concentrarem na base das plantas adultas, nas poulas radiculares e nas plantas jovens, o facto de todas estas se encontrarem menos expostas ao vento que as altas copas. Mas é, como disse, um factor adicional, já que as hipóteses da protecção contra a geada e da vantagem competitiva são explicações robustas, com valor do ponto de vista evolutivo e que nem se excluem mutuamente.
    Pude ainda constatar o seguinte: neste inverno, frio e ventoso, mas sem ondas de frio (vejam-se os boletins climatológicos do IM), as pequenas árvores de Q. robur com 1 a 2-3 anos mantiveram as folhas todo o inverno (como se de perenifólias se tratassem), até mesmo as que semeei no andar supratemperado, num local reparado, claro, e desde que protegidas da geada por outras ervas e restos orgânicos.

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  6. eu keria algo sobre a floresta semicaducifolia!!.-. .-.

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