Os montados constituem-se de um estrato monoespecífico de árvores que foi herdado de uma floresta densa pré-existente de sobreiro ou azinheira. A partir do bosque cerrado original, foram eliminados, através do fogo e meios mecânicos, outras árvores (por ex. carvalhos, catapereiros, zambujeiros), assim como os estratos arbustivo, herbáceo e lianóide. Em seguida, o sistema foi conduzido para um estádio metaestável da sucessão ecológica dominada por uma pastagem permanente cuja origem e persistência é mantida pela pressão de pastoreio ovino. As pastagens sob coberto em montados são frequentemente intercaladas num ciclo de rotação de cereais longo e de baixa perturbação do solo. Em sistemas pastoris pré-industriais estas pastagens eram utilizadas por grandes rebanhos transumantes desde as primeiras chuvas outonais até meados de Abril ou Maio. No início do século XX, o período de pousio permitindo o desenvolvimento de pastagens variou entre dois a dez ou mais anos, de acordo com a fertilidade da terra, a sua acessibilidade, sistema de preços e a racionalidade económica do proprietário.
As
pastagens do sistema de agricultura de montado podem ser grosseiramente
classificadas em cinco tipos.
O
primeiro corresponde às ‘malhadas’ de Poa bulbosa e trevo-subterrâneo (Trifolium
subterraneum). Tratam-sede pastagens vivazes que dependem de um pousio
longo sem mobilização do solo e pastoreio persistente de ovinos. Têm dois
máximos de produtividade de biomassa, no Outono e depois na Primavera e podem
atingir 0.75 LU.ha-1. As pastagens melhoradas semeadas de
trevo-subterrâneo são uma boa maneira de reconstituir as malhadas, dependendo a
sua manutenção, apenas de um mínimo de fertilização fosfatada, podendo, neste
caso, duplicar a sua produtividade. As misturas usadas podem conter outras
espécies de trevos e outras leguminosas. Estas pastagens são destruídas pelas
mobilizações, mesmo por gradagem ligeira, sub- , sobrepastoreio ou pastoreio
com bovinos.
Um
segundo tipo de pastagem vivaz ocorrente nos montados tem uma fenologia tardia
e é composta de combinações de Agrostis castellana/Festuca
ampla, dependente de pastoreio, adaptada a depressões ligeiramente húmidas
e é mais frequente em áreas de clima continental (com maior período de geadas).
Pode garantir o alimento de gado durante os meses de Verão.
O
terceiro tipo desenvolve-se em solos pobres ou erodidos, apenas durante a
Primavera e é constituída por plantas anuais de pequena biomassa que secam
rapidamente no final desta estação ou princípio do Verão. Têm uma grande
extensão na área de montado e constituem pastagens pobres que suportam
encabeçamentos muito baixos. Exemplos de plantas dominantes são: Anthyllis lotoides, Brachypodium distachyon, Coronilla repanda, Trifolium angustifolium, T. boconnei, T. cherleri, Plantago belardii, Tuberaria guttata, Ornithopus compressus, O. pinnatus, e Vulpia sp. pl. As pastagens anuais
efémeras, de pequena biomassa, não dependem do pastoreio e resultam das
lavouras e desmontas de mato após a lixiviação do azoto numa única estação de
chuvas.
O
quarto tipo é atualmente o tipo de pastagem mais comum e tratam-se de
comunidades herbáceas anuais dependentes da presença de azoto. São, de facto, comunidades
de ‘infestantes’ que beneficiam do azoto resultante da mineralização da matéria
orgânica originada pela mobilização, daquele remanescente da fertilização das
culturas em rotação ou das forragens introduzidas no sistema para alimentação
do gado. As espécies mais comuns são grâmineas: Bromus tectorum, B. rigidus, B. matritensis, Holcus anuus, Stipa capensis e Vulpia alopecurus, que formam arrelvados relativamente densos e altos, mas de baixa
palatibilidade e valor alimentar.
Um
quinto e último tipo corresponde a arrelvados de pequenas plantas anuais próprias
de locais húmidos no Inverno e Primavera ou em depressões de solos arenosos com
acumulação temporária de água e freatismo acentuado. São comunidades de pequenos
juncos e da gramínea Chaetopogon fasciculatus. Têm um
valor pastoral marginal.
Com as políticas
artificiais de preços dos cereais do final do século XIX e princípios do século
XX e a introdução da mecanização agrícola, as pastagens vivazes de malhadas (Poa bulbosa/ Trifolium subterraneum) e
de Agrostis castellana/Festuca ampla sofreram
uma forte regressão. Sucedeu a substituição do pastoreio ovino pelas rotações
cerealíferas curtas. O terceiro tipo subnitrófilo de pastagens banalizou-se
consequentemente. Para tal contribuiu também o fim da transumância nos anos 60
do século XX. As Políticas Agrícolas Comuns de redução da área de cereal desde
1985 resultaram, por seu turno, numa intensificação da produção de gado bovino
com recurso a forragem e ração com
origem externa ao sistema. Estes fatores têm tido um forte impacto na extensão
e qualidade das pastagens através da degradação da estrutura do solo com
aumento da dominância de plantas não palatáveis indesejáveis: as adaptadas á
compactação (diabelha – Plantago coronopus), à nitrofilia (cardos,
Chenopodium sp. pl.), ao encharcamento
temporário (Juncus sp. pl.) e
profusão de gramíneas sem valor pastoral: Stipa
capensis, Vulpia sp. pl. E Brachypodium distachyon. Tratam-se de
quatro décadas de forte diminuição da superfície de pastagens de montado com
real valor económico e ecológico. Torna-se pois urgente uma política racional e
de base científica para a recuperação do potencial produtivo das pastagens em
montados.
PS. Desculpem, mas constato que alguns links já não funcionam. Um deles curiosamente está encerrado devido ao encerramento dos serviços púclicos, devido não aprovação do orçamento nos EUA. Assim que puser substituirei por outros funcionais.
ResponderEliminarExcelente post, com abundante informação!
ResponderEliminarEsqueci-me de dizer que o Carlos Aguiar tb. participou na composição deste texto.
ResponderEliminarJC.
Podes explicar como o Habitat 6310 se posiciona aí pelo meio, sff?
ResponderEliminarBelo texto, como sempre.
ResponderEliminarMuito bom...
ResponderEliminarA transumância alterou a paisagem do centro da Península Ibérica de diversas maneiras, mesmo ao nível genético. A capacidade de transporte de sementes a longa distancia pelas ovelhas permitiu que as estirpes mais produtivas das espécies típicas das malhadas se dispersassem de forma mais eficiente.
ResponderEliminarO habitat 6310, no sentido em que foi interpretado consensualmente entre aqueles países que o possuem (Portugal, Espanha e Italia), existe apenas se existir o tipo de Poa bulbosa. Na medida em que muitos montados serão reconvertíveis a este tipo, pelo pastoreio ovino continuado do tipo efémero anual de pequena biomassa, esta interpretação será demasiado restritiva. NA minha opinião, desde que o montado não tenha como sobcoberto vegetação nitrófila, subnitrófila ou culturas, deve ser considerado habitat 6310. A presença de Poa bulbosa corresponde ao grau de melhor conservação e a dominãncia de outros tipos a situações de grau de conservação intermédio.
ResponderEliminarJC.